O aumento da demanda de pescado no mundo, fez com que os seres humanos tivessem que descobrir novas formas de obtenção dos recursos aquáticos. Com isso, houve o surgimento da aquicultura, a ciência que estuda técnicas de cultivo não só de peixes, mas também de crustáceos (como o camarão e a lagosta), de moluscos (como o polvo e a lula), de algas e de outros organismos que vivem em ambientes aquáticos (EMBRAPA, 2015).
Foto: Blog SANSUY. |
Este surgimento possibilitou o desenvolvimento de outra ciência de cultivos de organismos aquáticos que é chamada de maricultura. A maricultura é um ramo específico da aquicultura que engloba a produção de uma ampla variedade de organismos aquáticos marinhos e estuarinos, desde vegetais como as algas, invertebrados como crustáceos e moluscos, até vertebrados como peixes e répteis (FAO, 2010).
Neste sentido, trata-se de produção artificial, uma vez que não se dá de forma espontânea na natureza, mas sim induzida e controlada pela ação do homem. Devido a sua privilegiada extensão litorânea (8,5 mil km), seu mar territorial e sua Zona Econômica Exclusiva (ZEE) de duzentas milhas (4,5 milhões km2) e mais de 2,5 milhões de hectares de áreas estuarinas, o Brasil apresenta excepcionais condições para a expansão da maricultura (CAVALLI & FERREIRA, 2010).
No estado de Santa Catarina, que é o que apresenta maior atividade de maricultura no país, existem atualmente várias comunidades de pescadores artesanais e empresários envolvidos na maricultura, salientando-se os municípios de Florianópolis, Penha, Palhoça, Governador Celso Ramos e Bombinhas. O desenvolvimento da maricultura catarinense iniciou com o apoio da UFSC, da ACARPESC, e de pescadores artesanais que estabeleceram o 1o Condomínio de Pesca e Maricultura Baía Norte, em Florianópolis.
Em 1990 foi realizada a primeira produção comercial de cultivo de mariscos. Na época foram colhidas em torno de 190 toneladas. Formaram-se cooperativas de pesca e produção e foram introduzidas novas tecnologias para produção de sementes de ostras “Crossostrea gigas”, através do LCMM da UFSC,para os maricultores agregarem mais valor aos produtos. Posteriormente, com o apoio do SEBRAE, EPAGRI, FATMA, UFSC, FACISC e FAMPESC, foram desenvolvidas parcerias com vistas ao aumento da produção, ampliação dos mercados e capacitação empresarial dos maricultores. (EPAGRI, 1996). Conforme EPAGRI (2001), em Santa Catarina, até dezembro de 2000, estavam diretamente envolvidos na produção de mariscos 929 mitilicultores e no cultivo de ostras 127 ostreicultores.
Embora pareça pouco, indiretamente isso pode representar o emprego de aproximadamente 2.180 trabalhadores diretos e 6.350 indiretos e divisas de mais de cinco milhões de reais, números que tornam o setor representativo e viável economicamente, se considerarmos o pouco tempo em que a atividade foi posta em prática (Machado, 2002).
As algas marinhas são também uma boa alternativa para a atuação da maricultura no Brasil. No Rio de Janeiro, foi estudado a introdução de mudas de Hypnea musciformis que foram coletadas na Praia do Kutuca, na Ilha da Marambaia, município de Mangaratiba, RJ e fixadas em quatro unidades experimentais de maricultura (Reis et al., 2006).
No Ceará, houve a introdução da alga marinha vermelha Gracilaria birdiae em Icapuí. O cultivo desta alga apresentou bom desempenho após 56 dias de cultivo, principalmente no início do cultivo. No entanto, a Taxa de Crescimento Relativo e a biomassa das algas foram relativamente afetadas pelo posicionamento das estruturas próximas à costa, baixa profundidade e da turbidez da água, podendo seu cultivo ser utilizado comercialmente (Araujo & Rodrigues, 2011).
O espaço marinho no qual se dá a maricultura torna-se, na prática, uma área privativa do concessionário, não sendo possível, aí, o uso para qualquer outra finalidade, seja de recreação, como banho ou pesca aberta, ou mesmo simples travessia. Nestes lugares, por tratar-se da produção de organismos vivos que absorvem alimentos e eliminam dejetos, a maricultura tem grande potencialidade para poluir e contaminar as áreas de cultivo. A degradação do meio depende de muitos fatores, dentre os quais a temperatura e a circulação das águas e, sobretudo, a quantidade de animais em produção.
A superação da capacidade de suporte de um ecossistema vai produzir poluição do meio e contaminação dos peixes crustáceos e moluscos, isto é, alterar a qualidade química e física do ambiente e de seus frutos (Montibeller, 2002).
Os impactos causados pela maricultura na biodiversidade são raramente positivos, às vezes neutros, mas, normalmente, negativos. Impactos negativos podem ser diretos, por exemplo, pela introdução de material genético exótico no ambiente ou indireto, por perda de habitat e nicho ecológico (Ross & Kelly, 1994).
Os cultivos de peixes, crustáceos e moluscos geram resíduos na forma de partículas e material solúvel orgânico e inorgânico. A natureza e quantidade do efluente variam com o design da fazenda de cultivo, espécies cultivadas e nível de intensificação. Em geral, fezes, excretas e pseudofezes são as principais fontes de nutrientes inorgânicos e orgânicos. A coluna de água é o recipiente para o material dissolvido, enquanto a maior proporção de resíduos sólidos precipita-se para o sedimento abaixo da área de cultivo ou na vizinhança imediata da fazenda (Nunes & Parsons, 1998).
Essa deposição quase que imediata de matéria orgânica diária no sedimento, leva a um início de eutrofização com a diminuição da taxa de oxigênio dissolvido no meio. As bactérias, fungos e protozoários participam do processo de degradação da matéria orgânica e a liberação de gases tóxicos como enxofre se tornam inevitáveis. Nesse sentido, a alteração da comunidade marinha causada pelo acúmulo de matéria orgânica no sedimento já foi estudado por vários pesquisadores (Marques & Barbosa, 2001; Price, 2001; Nunes & Parson, 1998; Grant et al., 1995).
Para que a maricultura continue sendo desenvolvida no Brasil, ela precisa melhorar no quesito da sua sustentabilidade. A pesquisa científica pode atuar como um grande auxílio na formulação de políticas e de instrumentos de regulação para as atividades de maricultura, mitigando seus aspectos negativos.
Uma iniciativa são os controles sobre as condições da qualidade do meio também é uma solução viável, para o melhoramento do meio e o impedimento de eutrofização da região maricultora.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAUJO, Glacio Souza; RODRIGUES, José A. G. 2011. Maricultura da alga marinha vermelha Gracilaria birdiaeem Icapuí, Ceará. Disponível em: <https://doi.org/10.32360/acmar.v44i1.341>. Acesso em: 11/10/2020.
CAVALLI, Ronaldo Oliveira; FERREIRA, Jaime Fernando. 2010. O futuro da pesca e da aquicultura marinha no Brasil: a Maricultura. Cienc. Cult. vol.62 no.3 São Paulo, 2010.
EMBRAPA, 2015. Pesca e Aquicultura. Disponível em: <https://www.embrapa.br/contando-ciencia/pesca-e-aquicultura//asset_publisher/pzk4tXFfiHGh/content/o-que-e-aquicultura/1355746?inheritRedirect=false&redirect=https%3A%2F%2Fwww.embrapa.br%2Fcontando-ciencia%2Fpesca-e aquicultura%3Fp_p_id%3D101_INSTANCE_pzk4tXFfiHGh%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p_p_mode%3Dview%26p_p_col_id%3Dcolumn-3%26p_p_col_pos%3D1%26p_p_col_count%3D2> . Acesso em: 12/10/2020.
FAO. The state of world fisheries and aquaculture. Roma: Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2010. Zoologia Aquática, fev/jun de 2020
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MACHADO, Márcia. 2002. Maricultura como base produtiva geradora de emprego e renda: estudo de caso para o distrito de Ribeirão da ilha no município de Florianópolis/SC/Brasil. Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/83495/182924.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em: 11/10/2020.
NUNES, A. J. P. & PARSONS, G. J. Dynamics of tropical coastal aquaculture systems and the consequences to waste production. World Aquaculture. 29(2): 27-37. 1998.
PRICE, A. R. G.The marine chain in relation to biodiversity. The Scientific World. Vol.1, 579- 587. 2001.
REIS, Renata P.; CALDEIRA, Aline Q.; MIRANDA, Ana Paula dos Santos; BARROS-BARRETO, Maria Beatriz. 2006. Potencial para maricultura da carragenófita Hypnea musciformis (Wulfen) J.V. Lamour. (Gigartinales - Rhodophyta) na Ilha da Marambaia, Baía de Sepetiba, RJ, Brasil. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0102-33062006000400002>. Acesso em: 13/10/2020.
ROSS L. G. & KELLY L. A.Aquaculture and biodiversity. Royal Swedish Acad Sciences. Stockholm. 23 (8): 497-502. 1994.
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